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Foto: Josy Dinorah

Sou negro, logo existo: O outro lado do mercado

por Sintonia
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O reconhecimento da identidade do negro ganha as vitrines, comerciais e capas de revistas. A voz da beleza negra nunca foi tão ouvida e traz na representatividade o eco de uma sociedade miscigenada que merece respeito.

A luta pela representatividade em ser negro é denominada como uma minoria. Mas essa minoria ainda sente na pele o reflexo da negligência de séculos de sua existência e é fragilizada com o desemprego e desamparo social. Até pouco tempo atrás, não ofereciam barganha de compra e não era considerado o padrão tradicional para se pensar o marketing, a novela, a peça publicitária ou o catálogo de produtos de beleza, mesmo representando mais de 55{69386ad192db6c447fd6d404a6ebc86b266e8745e05dbe7a07c3f2a4a8f32d21} daqueles que fazem o capital girar.

A adoção de cotas afirmativas e a introdução de pautas históricas na discussão política e do cotidiano, já não deixam esconder a injustiça de ter o padrão branco europeu como diretriz no modo de vida do brasileiro. O tema diversidade ganha contornos de luta social e política para o protagonismo da pele negra como salto evolutivo e dinâmico na economia do País. Com as discussões e a visibilidade nas redes sociais, grandes marcas vêm alinhando as tendências para alcançar um público, até então, esquecido no mercado da beleza e da mídia. Movimentos isolados na internet, ganharam espaços em programas televisivos e os influenciadores digitais falam livremente e fazem a cabeça da maioria dos adolescentes.

Glauce Dekarla, 43 anos, sofreu para manter sua autoestima elevada com a dificuldade em encontrar profissionais e produtos que oferecem-se a oportunidade de cuidar e tratar seu cabelo crespo e volumoso. Mas mesmo não tendo muitas alternativas encontrou neste conflito o estimulo para estudar Estética e Cosmetologia na Universidade Anhembi Morumbi e o curso de cabeleireira no Senac, e desde 1998 ajuda mulheres à encontrar sua beleza e cuidado num atendimento igualitário no Salão Spa Crioulla. Após 20 anos de profissão, Glauce vê a mídia como uma aliada nos negócios e credita a maior visibilidade da mulher negra na televisão e nas revistas como uma crescente na procura das clientes à seu salão. “Na minha infância a oferta de produtos era muito escassa, restringindo-se a dois ou três marcas nacionais, que eram bastante agressivas, tanto ao cabelo quanto ao couro cabeludo. Ao abrir o salão, as marcas importadas estavam chegando ao Brasil com toda força. E, algumas dessas empresas com as quais trabalho até hoje, viram uma grande oportunidade e abriram suas fabricas no Brasil. Utilizando a mesma matéria prima importada da matriz, o que para nós profissionais, barateou o custo mantendo a boa qualidade. Antes, tínhamos uma pequena rede de distribuidores que atendiam por região. Hoje, há uma maior gama de produtos que são adquiridos do mesmo modo.”

Por que não ofertar a quem agora pode comprar? Grandes marcas descobriram as vantagens que o fortalecimento do movimento de empoderamento negro e feminino vêm tomando de importância na barra de rolagem e Stories das mídias sociais. Porém, o público negro ainda encontra muita dificuldade em encontrar produtos no mercado que atendam às suas necessidades e caiba no orçamento, como comenta a estudante Thainá Aparecida, 17 anos “Tem uma base da Avon que vai do número um ao sete, só que minha tonalidade é oito. E, essa tonalidade é vendida separadamente e é mais cara. Faz uns dois ou três anos, que a tonalidade de um a sete custava uma média R$19,99 e a minha tonalidade R$39,99. Como dobra-se o valor para aquele produto que eu gostaria de usar? É o mesmo produto! Hoje em dia, a gente tem as marcas, as sombras e as maquiagens, mas nem tudo está ao nosso alcance, você vê em Instagram aquelas maquiagens lindas, aí você quer comprar, mas são caríssimas. Não dá.” – Comenta.

“O momento econômico vai influenciar os tipos de produtos que serão produzidos e qual público será atendido, mas eu penso que é muito difícil recuar nesse sentido. Agora já existe a mulher, ela se descobriu bela e já entendeu que ela não precisa se europeizar ou imitar o branco para ser bonita. Os cabelos estão soltos e a necessidade de produtos para atender esta demanda existe, então a indústria e a mídia vai continuar nesta mesma linha.” – É com este olhar positivo que Winnie Santos, mestre em psicologia social pela PUC/SP e pesquisadora do prestigio social de gêneros e raças, credita esse fenômeno de mercado. Ela afirma que este movimento apresenta fatores muito positivos na psique humana e na inclusão do negro como representatividade na sociedade.

Repensar o foco de consumo pode ser o eco econômico na política e no modo social do Século 21, mas indústria já pode ouvir a voz unânime de três mulheres negras. Não existe o estranhamento em ser o outro e nem um distanciamento social tão grande, como há algum tempo atrás. Referências como Djamira Ribeiro, Iza, Karol Conka, Tia Má, entre outras tantas mulheres negras inseridas na elite cultural e intelectual do País, fazem muitas meninas e mulheres se fortalecerem para um futuro mais inclusivo, e anonimamente, mostram a força de um movimento que não pára e deixa claro que preconceito de curto prazo pode custar um alto preço do progresso no longo prazo.

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